sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

a propósito de "palavras"

- Não podemos escrever a nossa própria morte.
Foi o psiquiatra que me disse isto e eu estou de acordo com ele porque, quando estamos mortos, não podemos escrever. Mas, para mim, penso que posso escrever o que quiser, mesmo que seja impossível e mesmo que não seja verdade.
Em geral contento-me em escrever na minha cabeça. É mais fácil. Na cabeça, tudo se desenrola sem dificuldades. Mas, assim que escrevemos, os pensamentos transformam-se, deformam-se, e tudo se torna falso. Por causa das palavras.
Escrevo por todo o lado em passo. Escrevo a caminhar para o autocarro, no vestiário dos homens, defronte da máquina.
O aborrecido é que não escrevo o que deveria escrever, eu escrevo tudo e mais alguma coisa, coisas que ninguém pode compreender e que eu próprio não compreendo. À noite, quando copio o que escrevi na minha cabeça ao longo do dia, pergunto-me porque escrevi aquilo. Para quem e porque motivo.

de "Ontem", Agotha Kristof

Sem comentários: